Paisagem Humana

O melhor que se pode pedir a um artista é que nos fale de si através de posturas distintas. O universo de Maurizio Lancillota de grandes espaços vazios e de introspeção, que conhecemos através das suas paisagens, revela uma profunda reflexão sobre a vida que só conduz ao vazio que produz a falta de certezas. Mas o vazio converte-se em plenitude por causa do movimento rotativo dos opostos que se diluem num todo e aí confluem, e sem nos revelar nada, o pintor conta-nos tudo.

Na sua pintura, a referência ao mundo visível tem estado sempre velada por uma fina camada, a bruma, que é causada pela presença do incerto. Uma bruma que nos oferece dúvidas em vez de conclusões. Não importa o que esconde, e isto é válido para todas as suas obras, como veículo do seu pensamento.

Nesta exposição o pintor lança-nos para a luz. A série de pinturas que apresenta na Trema mostra sem esconder. Ou aparenta isso, porque a única coisa que nos separa da superfície da pintura é a outra camada brilhante, que torna o visível ainda mais explícito. Mas afinal o que é que agora apreendemos? Não apreendemos nada. Como aconteceu em tentativas anteriores da representação da figura humana, as bocas estão descontextualizadas e, muitas vezes, o pintor chega a uma abstração extrema, que se torna surpreendente.

E é na sua pintura que estas bocas nos devolvem o nosso próprio reflexo. E nós caminhamos do nada para o vazio, apesar do seu convite à sensualidade, a uma atitude mais prosaica e menos espiritual que parece desprender-se destas imagens, o que é reforçado pelo poder visual da resina, e que nos evoca humidade nestas bocas.

Agora que Maurizio Lanzillotta decide tornar-se transparente, isto é o que apreendemos, ocultou-se tanto, que nos parece lógico que só revela de si, aquilo que não pode negar a si próprio. E nestas pinturas ele recria-se incentivando-nos a partilhar os seus desejos.

                                                                                                                                                                         Carmen González Castro, Madrid, 2014